Pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes suspendeu o julgamento
de recurso sobre o tema apresentado pelo MP do Rio Grande do Sul.
Foi suspenso por pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes o
julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), do Recurso
Extraordinário (RE) 494601, no qual se discute a validade de lei do Rio
Grande do Sul que trata do sacrifício de animais em ritos das religiões
de matriz africana. Na sessão desta quinta-feira (9), o relator,
ministro Marco Aurélio, votou no sentido de dar interpretação conforme a
Constituição à lei estadual. Em seguida, adiantando seu voto, o
ministro Edson Fachin reconheceu a total validade do texto da norma.
O recurso foi interposto pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul
contra decisão do Tribunal de Justiça estadual (TJ-RS) que negou pedido
de declaração de inconstitucionalidade da Lei 12.131/2004. A norma
introduziu dispositivo no Código Estadual de Proteção aos Animais (Lei
11.915/2003) – que veda diversos tratamentos considerados cruéis aos
animais – para afastar a proibição no caso de sacrifício ritual em
cultos e liturgias das religiões de matriz africana. No STF, entre
outros argumentos, o MP-RS sustenta que a lei estadual trata de matéria
de competência privativa da União, além de restringir a exceção às
religiões de matriz africana.
Relator
Para o ministro Marco Aurélio, não há inconstitucionalidade formal da
norma, que está no campo de atuação legislativa do estado, uma vez que
não dispõe sobre matéria penal. Tampouco, segundo o ministro, a lei
gaúcha apresenta ofensa à competência da União para editar normas gerais
de proteção ao meio ambiente, já que não há lei federal sobre o
sacrifício de animais com finalidade religiosa. “A omissão no exercício
da atribuição de editar normas gerais sobre meio ambiente dá ao Estado
liberdade para assentar regras versando a matéria, observado o parágrafo
3º do artigo 24 da Constituição Federal”, afirmou.
Quanto às alegadas inconstitucionalidades materiais, o relator
entendeu não haver espaço para a supressão de rituais religiosos. “A
laicidade do estado não permite o menosprezo ou a supressão de rituais
religiosos, especialmente no tocante a religiões minoritárias ou
revestidas de profundo sentido histórico e social, como ocorre com as de
matriz africana”, afirmou. Contudo, observou o ministro, não caberia à
lei conferir tratamento privilegiado a essas religiões sem
justificativa. “A proteção do exercício da liberdade religiosa deve ser
linear, sob pena de ofensa ao princípio da isonomia”.
Outro ponto levantado pelo ministro foi a necessidade de “harmonizar a
proteção da fauna com o fato de o homem ser carnívoro”, uma vez que
existem situações em que o abate surge constitucionalmente admissível,
como no estado de necessidade para autodefesa ou alimentação. “O
sacrifício de animais é aceitável se, afastados os maus-tratos no abate,
a carne for direcionada ao consumo humano”, assentou.
O relator votou então pelo parcial provimento ao recurso
extraordinário, conferindo à lei do Estado do Rio Grande do Sul
interpretação conforme a Constituição Federal, para fixar a
constitucionalidade do sacrifício de animais em ritos religiosos de
qualquer natureza, vedada a prática de maus-tratos no ritual e
condicionado o abate ao consumo da carne.
Improcedência
O ministro Edson Fachin votou no sentido de negar provimento ao
recurso, mantendo o texto original da lei. Para ele, a menção específica
às religiões de matriz africana na lei gaúcha não traz
inconstitucionalidade, uma vez que a utilização de animais é de fato
intrínseca a esses cultos, e a eles deve ser destinada uma proteção
legal ainda mais forte, uma vez que são objeto de estigmatização e
preconceito estrutural da sociedade.
“Se é certo que a interpretação constitucional aqui fixada estende-se
às demais religiões que também adotem práticas sacrificiais, não ofende
a igualdade, ao contrário, vai a seu encontro, a designação de especial
proteção a religiões de culturas que, historicamente, foram
estigmatizadas”, afirmou.
O ministro também cita a Instrução Normativa nº 3/2000, do Ministério
da Agricultura, relativo ao abate humanitário, na qual também se
faculta o sacrifício para fins religiosos, o que, segundo o ministro,
revela não ser plausível sustentar que a prática de rituais com animais
implique prática cruel. A norma federal autoriza o sacrifício de acordo
com preceitos religiosos desde que destinado ao consumo por comunidade
religiosa ou ao comércio internacional, atendidos os métodos de
contenção dos animais.
FT/AD
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