Foi
suspenso nesta quinta-feira (31) o julgamento da Ação Direta de
Inconstitucionalidade (ADI) 4439 pelo Plenário do Supremo Tribunal
Federal (STF), na qual o procurador-geral da República pede que o
Tribunal assente que o ER nas escolas públicas somente poderá possuir
natureza não confessional. Até o momento, os ministros Roberto Barroso
(relator), Rosa Weber e Luiz Fux votaram pela procedência da ação. Já os
ministros Alexandre de Moraes e Edson Fachin votaram no sentido da
improcedência.
O julgamento da matéria teve início na
sessão de ontem (30), quando o relator, ministro Luís Roberto Barroso,
votou pela procedência da ação. Ele entendeu que o ER nas escolas da
rede oficial de ensino do país deve ser desvinculado de religiões
específicas e que deve ser vedada a admissão de professores para atuar
na qualidade de representantes das confissões religiosas.
Divergência
O julgamento foi retomado hoje com o
voto do ministro Alexandre de Moraes. Ao divergir do relator, o ministro
se manifestou pela improcedência da ação, por entender que o ER nas
escolas públicas brasileiras deve ter natureza confessional, ou seja,
vinculado às diversas religiões, devendo ser voluntária e expressa a
vontade do aluno em se matricular na disciplina.
Ele propôs, também, que as aulas sejam
ministradas por meio de parcerias com as diversas confissões religiosas,
sem a necessidade de realização de concurso público. Segundo o
ministro, o Estado ficaria responsável pelas salas de aula e a
organização, e as crenças religiosas, previamente cadastradas em
igualdade de condições, ofereceriam o seu ensino.
De acordo com o ministro, as normas
questionadas pela PGR – dispositivos da LDB e do acordo firmado entre o
Brasil e a Santa Sé – não ofendem a Constituição Federal. Ele observou
que a Constituição garante a liberdade de expressão às ideias
majoritárias e minoritárias, progressistas e conservadoras, políticas e
religiosas. Assim, avaliou que “não se pode, previamente, censurar a
propagação de dogmas religiosos para aquele que realmente quer essas
ideias”.
Para o ministro, deve haver respeito à laicidade do
Estado, à liberdade religiosa e ao ensino confessional , com observância
do princípio da igualdade em relação à possibilidade de oferecimento de
ensino religioso a todas as crenças. Conforme Alexandre de Moraes, a
democracia exige tolerância, diversidade de opiniões e espírito aberto
ao diálogo, “base para a construção de uma sociedade mais forte e mais
livre”.
Ainda segundo o ministro, a elaboração
de conteúdo único e oficial para a disciplina ER pelo Estado, nela
resumindo os principais aspectos descritivos, históricos, filosóficos e
culturais de várias religiões e assumindo a responsabilidade de
ministrá-la, configuraria um duplo desrespeito à consagração da
liberdade religiosa. Segundo ele, não seria possível estabelecer
conteúdo mesclando as diversas crenças religiosas, em desrespeito a
singularidade de cada uma delas.
Em voto pela improcedência da ação, o
ministro Edson Fachin observou que o princípio da laicidade não se
confunde com laicismo, mas apenas veda que o Estado assuma como válida
uma crença religiosa ou uma determinada concepção de vida em relação à
fé. Para o ministro, a separação entre igreja e Estado não pode implicar
o isolamento dos que guardam uma religião à sua esfera privada.
Segundo
Fachin, o preparo para o exercício da cidadania, objetivo imposto pelo
texto constitucional ao direito à educação, só tem sentido se
desenvolvido para estimular uma sociedade democrática e plural, sem
eliminar as razões religiosas, mas traduzindo-as. “A escola deve
espelhar o pluralismo da sociedade brasileira. Ela deve ser um
microcosmo da participação de todas as religiões e também daqueles que
livremente optaram por não ter nenhuma”, argumentou.
Procedência
Ao seguir o voto do relator, a ministra
Rosa Weber afirmou que a interpretação sistemática e harmônica dos
textos constitucionais suscitados na ADI leva ao endosso da tese de que o
ER nas escolas públicas só pode ser o de natureza não confessional. Em
seu entendimento, a disciplina não pode estar vinculada a qualquer
crença ou religião, sob pena de comprometimento do princípio da
laicidade, que professa a neutralidade do Estado quanto às diversas
religiões de modo a proporcionar convivência pacífica entre os
seguidores das diversas confissões e assegurar respeito aos indivíduos
que optam por não professar religião alguma. “Religião e fé dizem
respeito ao domínio privado e não com o público. Neutro há de ser o
Estado”, afirmou.
Em seu voto, o ministro Luiz Fux também
acompanhou o posicionamento do relator e defendeu a possiblidade
exclusivamente não confessional do ER na rede pública. Ele pontuou
inicialmente que o Brasil é uma nação pluriétnica e plurirreligiosa,
regido pela laicidade do Estado, liberdade religiosa, igualdade e
liberdade de expressão e de consciência. Frente a isso, indagou se é
razoável a escola pública ser um espaço para se transmitir lições de fé a
crianças e adolescentes.
Fux fez ressalvas, adicionalmente,
quanto à hipótese de contratação de professores religiosos, o que iria
de encontro ao princípio da isonomia, atingindo os professores laicos
que se dedicaram ao estudo da religião. Observou ainda que o próprio
texto do artigo 33 da LDB foi reformado para excluir a previsão do
ensino confessional. “A educação pública religiosa, universalista e não
confessional é a única apta a promover gerações tolerantes que possam
viver em harmonia com diferentes crenças na sociedade plural, ética e
religiosa”, concluiu.
O julgamento deve ser retomado na sessão do dia 20 de setembro.
Íntegra do voto do ministro Alexandre de MoraesÍntegra do voto do ministro Edson Fachin
Fonte: STF