quinta-feira, 23 de setembro de 2021

23 de setembro, Dia Estadual do Ecumenismo no Pará

Assembleia do CAIC na IPU, em 08/05/2010

Em tempos sombrios, como o que vivemos, governados por pervertidos e negacionistas, que se sustentam numa minoria barulhenta e agressiva, além dos robôs projetores de discursos de ódio e mentiras na internet, é urgente celebrar qualquer iniciativa que contrarie e subverta esta ordem das coisas. Por isso, a celebração do Dia Estadual do Ecumenismo chega junto com um sopro de esperança e um exemplo de exercício da fé para a promoção do diálogo, não para a perseguição de quem "crê" diferente.

O QUE É ECUMENISMO
Precisamos lembrar que o termo Ecumênico deriva do grego oikouméne, que significa casa comum. Faz lembrar que todos/as nós habitamos o mesmo "lar", uma metáfora que ajuda a denunciar que uns estão em "cômodos" mais confortáveis, mas a maioria tem que se aglutinar do "pátio" para fora.
O Ecumenismo, em síntese, é um movimento de união de igrejas cristãs no trabalho missionário e ações de justiça social. Sua expressão institucional moderna pode ser identificada na criação de organizações como o Conselho Mundial de Igrejas (CMI), o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs (CONIC) e o Conselho Amazônico de Igrejas Cristãs (CAIC). Convencionou-se chamar de Ecumenismo a reunião entre pessoas e instituições cristãs e de Diálogo Inter-religioso quando o encontro religioso reúne grupos de outras crenças, espiritualidades, tradições ou filosofias de vida.

O NASCIMENTO DA PROPOSTA

ALEPA: sessão especial da CFE 2010

Na Sessão Especial promovida pela Assembleia Legislativa do Pará (ALEPA) para debater a realização da Campanha da Fraternidade Ecumênica (CFE) de 2010, no dia 05 de abril, houve a proposta de se marcar no calendário oficial do Estado do Pará uma homenagem às iniciativas ecumênicas na região.
Naquele ano, além da CF Ecumênica, estávamos rememorando o centenário da Conferência Missionária de Edimburgo - Escócia, que reunião mais de 1.500 delegados/as de ministérios protestantes  da Europa e Estados Unidos, tornando-se um marco para o Ecumenismo "moderno".
No meu pronunciamento, naquele período como coordenador do Conselho Amazônico de Igrejas Cristãs (CAIC), que compartilhava com a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) a responsabilidade de disseminar nas igrejas e na sociedade o tema “Economia e Vida” e o lema “Vocês não podem servir a Deus e ao dinheiro” da CFE, levantei a proposta de se criar o Dia do Ecumenismo.
A deputada Bernade Ten Caten, que presidia a Sessão, abraçou a proposta e pediu para que a oficializássemos junto ao seu Gabinete. Após aprovação na Assembleia do CAIC (primeira foto desta matéria), de 08 de maio de 2010, que ocorreu na sede da Igreja Presbiteriana Unida, em Ananindeua, a assessora teológica do CAIC, socióloga e teóloga Roseane Brito, ficou responsável por redigir a minuta do Projeto de Lei.
Sua principal fonte histórica, de onde retirou a data simbólica, foi a dissertação do prof. dr. Antônio Carlos Teles da Silva, que é mais conhecido como pastor Toninho, pois já atuou no Pará como pastor metodista e, anos depois, luterano, além de ter sido professor na Universidade do Estado do Pará (UEPA). No trabalho intitulado "As origens do movimento ecumênico na Amazônia paraense", pr. Toninho usa sua experiência de militância ecumênica para forjar uma pesquisa historiográfica e teológica sobre o assunto, com o recorte geográfico de onde vivenciou as práticas de unidade entre igrejas cristãs e substancioso referencial teórico.

POR QUE 23 DE SETEMBRO?
Segundo os estudos do pr. Toninho, no início da década de 1980, em plena ditadura militar, a repressão do estado brasileiro dobrava sua violência na Amazônia.
A dissertação apresenta a reunião de diferentes credos no velório do estudante de Matemática César Moraes Leite, morto em sala de aula, na UFPA, no dia 10 de março de 1980, com um tiro "acidental" de um agente da Polícia Federal que espionava as organizações estudantis. O pr. Toninho, que era estudante na época, participou do cortejo e das demais manifestações.

O Memorial César Moraes Leite faz o seguinte registro sobre o citado velório:

A realização de um culto ecumênico que fora realizado pelo padre Savino Mombelli, que era professor de Teologia da UFPA, do padre Ricardo Rezende Figueira que era vice-presidente da CPT da região do Araguaia-Tocantins, do padre Bernard Hoyos Montoya que era professor da UFPA, do Frei Edilberto Sena de Santarém, de [pastora] Rosa Marga Neves da Igreja Evangélica Confissão Luterana e do rabino Abrahão Hamu da Igreja Israelita do Brasil. O documento destaca a postura de radicalização do referido culto ecumênico frente do regime militar especificando a atuação dos padres Savino Mombelli e Ricardo Figueira e da teóloga Rosa Marga Neves.
Vale lembrar que eram recentes as memórias da covardia das Forças Armadas na Guerrilha do Araguaia, que foi tão brutal, que ainda hoje o principal nome do exercício ilegal das funções militares no embate, Major Sebastião Curió, responde por tortura, assassinato e ocultação de cadáveres.
Neste clima de tensão, em 1981, ao redor da cidade paraense de São Geraldo do Araguaia, posseiros/as, ou seja, grupo de trabalhadores/as rurais que plantavam em terras latifundiárias reivindicadas por vários supostos "donos", vinham sendo ameaçados pelos fazendeiros para desistirem de trabalhar nas roças abertas. Jagunços pagos pelos fazendeiros botavam fogo nas casas dos/as lavradores/as e desfilavam com suas armas como intimidação.
Os padres franceses Aristides Camió e Francisco Gouriou se solidarizaram com a situação dos/as posseiros/as e passaram a fazer a assistência daquele povo. Não tardou em vir a perseguição. Em agosto de 1981, ações intensas da Polícia Federal, apoiada pelo Exército Brasileiro com uso de helicópteros e armamento pesado, sitiaram a cidade na caça aos/às posseiros/as e dos padres que ajudava aquelas famílias.
Até que, no dia 31 de agosto de 1981, prenderam os padres Aristides Camió e Francisco Gouriou e, inclusive, a senhora Oneide Ferreira Lima, agente de pastoral, viúva do líder assassinado “Gringo” e vizinha da casa paroquial.
A pressão das manifestações locais e a repercussão nacional do caso forçaram a transferência dos presos para a sede da PF em Belém, incluindo os padres, no dia 11 de setembro de 1981. Entidades da sociedade civil, organizações religiosas e partidos políticos da oposição à ditadura criaram o Movimento Pela Libertação dos Presos do Araguaia (MLPA), que promoveu abaixo-assinados, panfletos, informativos e manifestações públicas que denunciavam a injustiça das prisões e os espancamentos e cerceamento de direitos humanos no cárcere.
Em 21 de setembro de 1981, chegam a Belém os familiares dos presos políticos do Araguaia e foram fazer as visitações no cárcere. Os relatos confirmaram as violências da prisão. Então, juntando todas as informações de desrespeito aos direitos básicos de um ser humano e a indignação diante de tanta opressão, no dia 23 de setembro de 1981, ocorreu um culto ecumênico em frente à sede da Polícia Federal, reunindo representantes das Igrejas Católica, de Confissão Luterana (IECLB), Metodista, Batista e Evangelho Quadrangular.

Este culto ecumênico de 23 de setembro de 1981, em Belém, clamando por justiça e liberdade aos presos do Araguaia foi escolhido como marco para o movimento ecumênico regional. Engajar-se na luta por justiça e fraternidade, acolher quem sofre opressão e cooperar para a cultura de paz, são princípios do Ecumenismo, muito bem representados naquela celebração pela vida.

A LEI N° 7.665, DE 9 DE OUTUBRO DE 2012.
Após protocolarmos a proposta de Lei do Dia Estadual do Ecumenismo no Pará, em meados de 2010, apresentamos ofício para todos os gabinetes de deputados/as em defesa da aprovação. Após mais de um ano de tramitação, em 09 de outubro de 2012, a lei foi sancionada (veja aqui).
Sabemos, como diria Drummond, que os "lírios não nascem das leis". Mas usar os meios oficiais para provocar uma reflexão sobre o Ecumenismo na Amazônia visa incentivar que novas pessoas descubram estas histórias e se envolvam neste exercício de fé, militância pelo bem comum e diálogo.
O Dia Estadual do Ecumenismo no Pará também serve para render homenagem a quem deu grande contribuição para iniciativas ecumênicas. E aqui, em nome de várias irmãs e vários irmãos que se dispuseram a prestar um testemunho de entrega ao próximo, celebramos a memória de nossa saudosa pastora de Confissão Luterana Rosa Marga Rothe, que nos deixou em 04 de junho de 2016. Pastora Marga esteve no culto ecumênico de 23 de setembro de 1981, em frente da sede da Polícia Federal, foi a primeira Ouvidora do Sistema de Segurança Pública do Pará, contribuiu na fundação do CAIC e na criação da Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos (SDDH).


Prof. Tony Vilhena - Cientista Político

terça-feira, 21 de setembro de 2021

Política e religião. A divisão de cargos políticos por crença no Líbano.

Na década de 1940, instituiu-se a tradição que indica que a presidência do país deve ser ocupada por um cristão maronita, o primeiro-ministro deve ser um muçulmano sunita e o porta-voz do parlamento deve ser um muçulmano xiita.

LÍBANO E SUAS CRISES
Já havia um histórico de crise econômica e impasse político no Líbano, país da Ásia que faz fronteira com a Síria ao norte e Israel ao sul. Mas tudo piorou quando no dia 04 de agosto de 2020 uma explosão arrasou o porto da capital Beirute e seus arredores, matando mais de 200 pessoas e deixando mais de 6 mil feridos.
A explosão de centenas de toneladas de nitrato de amônio, que eram armazenadas inapropriadamente sob os olhares negligentes das autoridades de segurança, também fizeram desmoronar o governo libanês. Protestos forçaram a renúncia do primeiro-ministro Hassan Diab, eminente professor de engenharia na Universidade Americana de Beirute e ex-ministro da Educação, que vivia o ápice de sua ascensão política. O caos se estabeleceu, atrapalhando, inclusive, as tentativas de ajuda internacional, visto que os países ficaram inibidos em contribuir para a reconstrução de Beirute, correndo o risco de verem suas ajudas serem desviadas pela corrupção ou dissipadas em outros gastos provocados pelas disputas internas. Entretanto, ressaltamos, que este não é o caso da ajuda prometida pelo governo brasileiro: quatro mil toneladas de arroz. Passado todo esse tempo, não foi enviada por mera incompetência mesmo.

ACORDO CONFESSIONALISTA

 Nabih Berri (presidente do Parlamento), Michel Aoun (presidente da República) e Najib Mikati (primeiro-ministro). Foto: STRINGER / DALATI AND NOHRA / AFP

Somente no dia 10 de setembro de 2021 (foto acima), passado mais de um ano da tragédia, enfim, parece que as forças políticas libanesas chegaram a um acordo para o reordenamento daquela República parlamentarista. Mas há um detalhe que poucos conhecem da representação política libanesa: a divisão dos cargos respeita a divisão de crenças majoritárias, ou seja, há um sistema eleitoral que garante que os assentos da Assembleia Nacional devem ser divididos entre cristãos e muçulmanos.
Num país erguido na diversidade conflitante, foi necessário criar uma equação política e religiosa em busca de consenso.  No livro Tensões Mundiais, Jamil Zugueib Neto e Fábio Bacila Sahd* apontam as origens beligerantes da criação de um Estado libanês:

"as populações que habitavam aquele território já se caracterizavam por marcadas cizânias sectárias. Às identidades religiosas mesclavam-se o preconceito, os interesses políticos conflitantes e a hegemonia de umas sobre as outras, resultando em  recorrentes  embates  armados  e  deslocamentos  populacionais" (p. 18).
Os vencedores da Primeira Guerra Mundial se dividiram na exploração dos territórios petrolíferos do Oriente Médio. Coube à França ficar na administração do Líbano, que perdurou até a independência, em 1943. E é nesta década de 1940 que se instituiu a tradição que orienta que a presidência do país deve ser ocupada por um cristão maronita, o primeiro-ministro deve ser um muçulmano sunita e o porta-voz do parlamento deve ser um muçulmano xiita. Este sistema de divisão do poder político a partir das bases religiosas é conhecido como "confessionalismo".
A Constituição libanesa (disponível aqui, em Inglês), em seu Art. 24, garante que o Poder Legislativo tenha representação igual entre cristãos e muçulmanos; e representação proporcional entre os grupos confessionais dentro de cada uma das duas comunidades religiosas.

ACORDO DE TAIFE

A institucionalização constitucional desse arranjo entre política e religião foi firmada no Acordo de Taife, em 1989. Taife é uma cidade na Arábia Saudita que, em 22 de outubro de 1989, abrigou o encontro entre 62 parlamentares libaneses, sendo 31 cristãos e 31 muçulmanos, para redigirem a Carta Nacional de Reconciliação.
Este movimento de "reconciliação nacional" visava encerrar anos de guerra civil (1975-1990), que foram dolorosos para todos os segmentos, com massacres mútuos e envolvimento/invasão dos países fronteiriços Síria e Israel.
Em Taife, foi decidido que se aumentaria o número de assentos do Parlamento para 128 representações, que abaixo demonstraremos como estão ocupados nos dias de hoje.
 
QUEM É QUEM?
Em suma, usando levantamento da pesquisa intitulada O Líbano e o Nacionalismo Árabe, de José Ailton Dutra Júnior**, podemos saber que:
"atualmente (2014) o estado libanês reconhece oficialmente 18 comunidades religiosas. Entre as cristãs temos: os maronitas, greco católico,   greco   ortodoxo,   armênios   gregorianos,   armênios   católicos,   sírios   ortodoxos (jacobitas),  protestantes,  etc.  Entre  as  muçulmanas:  sunitas,  xiitas,  drusos,  alauítas. Também houve  o  reconhecimento  oficial  dos  judeus  que  chegaram  a  contar  com  alguns  milhares  de indivíduos" (p. 19).
Destacaremos os três segmentos que dividem o poder político: moronitas (cristão), sunitas e xiitas (muçulmanos). Entre as teorias da presença maronita na região, grupo cristão mais numeroso, diz-se que descendem dos seguidores de São Maron e estão presentes na região desde o século VI. Em 1736, a Igreja Maronita se incorporou à Igreja Católica Apostólica Romana, tendo a garantia de manter sua liturgia siríaca e língua aramaica, a falada por Jesus.
Continuando, temos os sunitas, maior segmento do Islã, com forte presença e considerável crescimento na África e Ásia. Já os xiitas são minoritários no Islã, mas já foram o segmento religioso mais numeroso no Líbano, pois foram os primeiros a ocupar o território. A diferença entre sunitas e xiitas está na raiz do islamismo. Pois, para os xiitas, após a morte de Maomé, quem deveria assumir a liderança por herança eram os familiares diretos do profeta, mas, os sunitas consideram heréticas as práticas devocionais manifestadas pelos xiitas aos herdeiros de Maomé.

DESENHO DA REPRESENTAÇÃO PARLAMENTAR
Após a última eleição, em 06 de maio de 2018, temos os seguintes grupos políticos (por número de assentos) com representação na Assembleia Nacional:
- Movimento Patriótico Livre (29): cristão.
- Movimento do Futuro (21): muçulmano sunita.
- Amal (17): muçulmano xiita.
- Forças Libanesas (15): cristão.
- Hezbollah (14): muçulmano xiita.
- Partido Socialista Progressista (9): druso.
- Movimento Azm (4): muçulmano sunita.
- Federação Revolucionário Armênia (3): cristão.
- Kataeb (3): cristão.
- Movimento Marada (3): cristão.
- Partido Social Nacionalista Sírio (3): secular.
- Sunitas pró-8 de Março: muçulmano sunita.
- Bloco Karami (2): muçulmano sunita.
- Sociedade Civil (1): secular.
- Independentes (6): indeterminado.
De 15 grupos políticos apresentados, 12 são orientados por motivação religiosa, sendo 5 cristãos e 7 islâmicos.
As próximas eleições parlamentares são previstas para o mês de maio do ano que vem (2022). Abaixo temos a distribuição dos mandatos, hoje.

Wikipedia

GOVERNO ATUAL
Libnanews

No encontro do último 10 de setembro, compôs-se  o poder da seguinte maneira: o muçulmano xiita Nabih Berri  é o porta-voz do Parlamento, o cristão maronita Michel Aoun  é o presidente da República, o muçulmano sunita Najib Mikati é o primeiro-ministro. O vice-primeiro-ministro é o cristão greco-ortodoxo Saadeh al Shami.
Segundo a Agência Fide, no dia 20 de setembro de 2021, após um intenso debate de mais de 7 horas, o Parlamento deu seu voto de confiança aos atuais ministérios, que compõem este novo governo, e que são divididos assim: 11 cristãos (
cinco maronitas, dois gregos ortodoxos, dois gregos católicos, um apostólico armênio, uma católica de rito latino), 9 muçulmanos (cinco xiitas e sunitas) e 2 drusos. Sendo que somente uma mulher assumiu um ministério. Trata-se da cristã de rito latino Najla Riachi, que tornou-se a ministra para a reforma da Administração.
Somente as Forças Libanesas, que são nacionalistas cristãos de extrema direita, e alguns deputados independentes votaram contra, somando 15 votos. Foram 85 votos a favor e 17 abstenções.

AUDIÊNCIA PÚBLICA NO BRASIL
Há relações estreitas entre o povo libanês e o brasileiro. Inclusive, a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE) do Senado Federal, expressando essa preocupação com o contexto atual de instabilidade no Líbano, promoverá uma audiência pública remota, no dia 23 de setembro de 2021, a partir das 10h, na ala Alexandre Costa, com transmissão pelos canais públicos e gratuitos. Para se inscrever, clique aqui (Senado).


Referências:

* ZUGUEIB NETO, Jamil; SAHD, Fabio Bacila. Líbano: nação ou agregado de grupos religiosos? Tensões Mundiais, v. 6, n. 11, 2010. Disponível aqui.

** DUTRA JUNIOR, José Ailton. O Líbano e o Nacionalismo Árabe (1952-1967): O Nasserismo como projeto para o Mundo Árabe e o seu impacto no Líbano. 2014. 320 f. Dissertação (Mestrado em História Econômica) - Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas - Universidade de São Paulo. São Paulo, 2014. Disponível aqui.
 

Prof. Tony Vilhena - Cientista Político

terça-feira, 7 de setembro de 2021

Religião nas Olimpíadas de Tóquio 2020

Os jogos olímpicos são um evento esportivo que expressa a pluralidade dos países e culturas numa demonstração de habilidade e competitividade para premiar os melhores em cada modalidade. As suas origens são de cunho religioso, pois datam do ano 776 a.C, em Olímpia, na Grécia, dentro das tradições mitológicas gregas, em atos devocionais a Zeus, entre outras divindades.

Com o atraso de um ano devido à pandemia do Corona Vírus, de 23 de julho a 08 de agosto e de 24 de agosto a 05 de setembro de 2021 tivemos, respectivamente, as Olimpíadas e Paralimpíadas de Tóquio. Entre conquistas e frustrações, destacamos aqui dois registros que tocaram na importância do respeito à diversidade religiosa, sobretudo, à valorização dos povos tradicionais de matrizes africana. 

Flechas de Oxóssi

@Ubanda7
 

Primeiro, temos a comemoração do quarto gol brasileiro contra a Alemanha, em 22 de julho, que terminou com a vitória por 4x2. Após o chute certeiro, o autor do belíssimo gol, atacante Paulinho, correu eufórico pela lateral do campo e surpreendeu ao simular o lançamento de uma flecha, pose gestual do orixá Oxóssi, que é celebrado como divindade responsável pela caça, pelo alimento, pela fartura.

Nas vésperas das Olimpíadas, Paulinho já havia feito a declaração sobre o que ele chama de sua "filosofia de vida", na plataforma que publica textos de atletas "The Players' Tribune".

"Minha família tem ligação forte com o candomblé e a umbanda. Tenho muito orgulho da minha religião. Se bem que… Religião, não. Prefiro chamar de filosofia de vida. Cultuar essa filosofia me traz muita energia boa, muito axé. Como assentado e praticante, vou ao meu pai de santo sempre que estou no Brasil e peço proteção aos orixás, principalmente ao meu Pai Oxóssi e à minha Mãe Iemanjá. Exu é o caminho. Procuro saudá-lo antes de cada obrigação, de cada partida".

Suas palavras são poderosas. Romperam o silencio intimidador que o racismo impõe às pessoas praticantes de religiões de matrizes africanas, principalmente nos esportes, e deram visibilidade para a necessidade de se combater a intolerância religiosa. Após a seleção brasileira tornar-se medalha de ouro, Paulinho usou as redes sociais e fez a seguinte postagem: "Nunca foi sorte, sempre foi Exú!".

Contas de Iemanjá e Oxóssi

Wikipedia/RicardoGomesdeMendonça

Segundo, temos a alegria irradiante do atleta paralímpico Ricardo Gomes de Mendonça, ganhador da medalha de bronze na prova de 200 metros rasos T37, disputada por atletas com sequela físico-motora devido a lesão encefálica, no dia 03 de setembro.

Ao subir ao pódio e receber sua medalha, Ricardo abre o agasalho para retirar seus colares ou fios de contas, juntando-os à medalha sob o peito. Uma imagem emocionante e inesquecível. Para afrorreligiosos/as, os fios de contas simbolizam a companhia do Orixá ou da Entidade que se devotam. O narrador do canal Sportv, percebendo o momento histórico daquele ato simbólico de resistência antirracista, tratou logo de contextualizar a realidade de preconceitos e perseguições sofridas pelas religiões de matrizes africanas, chegou a citar a frase "respeito seu amém, respeite meu axé!", em alusão a necessidade das religiões cristãs majoritárias observarem o direito das religiões de terreiro de serem respeitadas.

Dos poucos registros sobre este "detalhe" na premiação, consideramos aqui a exposição do Twitter da jornalista Flávia Oliveira - @flaviaol, que postou instantaneamente a seguinte declaração: "irmão de axé Ricardo Gomes de mendonça, bronze nos 200m T37, mostrando os fios de contas de Iemanjá e Oxóssi no pódio. Salve!".

Ouro na luta contra a intolerância religiosa

Os gestos dos atletas Paulinho e Ricardo são importantes para a representatividade. Quantas crianças e jovens de terreiros puderam se ver neles, em diferentes cenários esportivos, num evento de importância internacional, expressando sua fé e sua visão de mundo. Marcaram estas Olimpíadas e o esporte brasileiro. Pois o esporte é estratégico para a abordagem de assuntos de interesse geral, entre eles o racismo, visto o seu alcance social e o sua capacidade de reunir as pessoas das mais diferentes formações e origens.


Por Tony Vilhena - Cientista Político.

sexta-feira, 28 de maio de 2021

Pe. Bruno, presente!

 

A Fraternidade Emaús convida para celebração da memória do 1º ano de páscoa do querido Pe. Bruno Sechi.

O evento será transmitido ao vivo no sábado, dia 29 de maio de 2021, às 9h.

O link da transmissão no Facebook e Youtube do Movimento República de Emaús:

https://www.facebook.com/movimentorepublicadeemaus

https://www.youtube.com/channel/UCmmvMKsbhmE7uKotXAOuVcw

sábado, 22 de maio de 2021

Prefeitura de Parauapebas nomeia professores sem habilitação exigida no edital do concurso


O autor estadunidense F. Scott Fitzgerald escreveu o conto "O curioso caso de Benjamin Button", que, em 2008, virou filme de sucesso, estrelado por Brad Pitt e vencedor de Oscar. Trata-se da história de um homem que nasce idoso e com o passar do tempo vai rejuvenescendo, o que inverte a lógica da vida.
A Prefeitura de Parauapebas, quem sabe na busca do seu "Oscar" de ataque à educação, também resolveu protagonizar um história que surpreende qualquer telespectador da administração pública: nomeou professores sem formação exigida nos Editais 01/2017 e 02/2018 do Concurso Público. Isso afronta a legislação dos concursos públicos e a legislação educacional, apadrinhando candidatos que não apresentam os requisitos mínimos para o cargo.
A denúncia é da Associação dos Cientistas da Religião do Estado do Pará (ACREPA), que descobriu que a Secretaria Municipal de Educação de Parauapebas (SEMED) nomeou professores de Ensino Religioso sem a habilitação exigida no edital, que determina que o/a candidato/a tenha “diploma de conclusão de curso de graduação de licenciatura plena em Ciências da Religião, fornecido por instituição de ensino Superior reconhecido pelo ministério da Educação”.
A quem interessa esse apadrinhamento institucional? Quais as consequências para o processo de ensino-aprendizagem de estudantes da rede municipal a ausência de formação adequada de seus/suas professores/as? Como isso favorece um ensino catequético (que favorece um segmento religioso com recursos públicos) e não-científico?
A nota da ACREPA (ver aqui) aponta que a SEMED pode ter contrariado a lei, mas não por falta de informação. Pois já havia sido alertada sobre a possibilidade de candidatos sem habilitação se apresentarem para o posto do concurso.
O Ministério Público do Estado do Pará (MPPA) já recebeu o caso e entidades de respeito apoiam a denúncia da ACREPA. Já se posicionaram a favor da nota da ACREPA:
• Coordenação do Curso de Graduação de Licenciatura Plena em Ciências da Religião da Universidade do Estado do Pará (UEPA)
• Grupo de Estudo e Pesquisa em História e Filosofia da Ciência na Amazônia – Movimentos Sociais, Educação e Cidadania na Amazônia (GMSECA/UEPA)
• Grupo de Estudo Religiões de Matriz Africana na Amazônia (GERMAA/UEPA)
• Grupo de Pesquisa Instituições, Movimentos e Culturas Evangélicas na Amazônia (Micea/UEPA)
• Fórum Permanente Educação Étnica Racial (FOPEDER)
• Associação de Consciência Negra Quilombo (ASCONQ)
• Associação dos Cientistas da Religião e dos Professores de Ensino Religioso do Estado do Amazonas (ACREPERAM)
• Associação Internacional de Estudos de Afetos e Religiões (AMAR)/ FOGO Editorial
• Coletivo Independente de Professores de Ensino Religioso de Uberlândia-MG (C.I.P.E.R.U)
• Instituto Ramagem - Defesa e Promoção da Liberdade e Diversidade Religiosa.
• Rede Amazônia Negra Pará.
• Comitê Inter-religioso do Pará.


Prof. Msc. Tony Vilhena
Cientista Político

quinta-feira, 15 de abril de 2021

SOU LGBTI+ SIM! – DIVERSIDADE E VIDA CRISTÃ

Lançado o 1º módulo do Programa de Formação de Lideranças Evangélicas Afirmativas - FLEA.lab, do Evangélicxs pela Diversidade e Plataforma Intersecções.


<<NÃO PRECISA ADERIR AO PROGRAMA COMPLETO PARA FAZER O MÓDULO>>

Para quem se destina: O Laboratório de Formação de Lideranças Evangélicas Afirmativas - FLEA.lab é uma iniciativa de formação para juventude, ativistas e lideranças evangélicas progressistas de todo o país, para abordar o tema da diversidade sexual e de gênero no mundo evangélico a partir de uma perspectiva afirmativa.

Quando e onde: Turma 1 - 20, 21 e 22 de abril (terça, quarta e quinta), das 19h às 21h | Turma 2 - 24 de abril (sábado), das 13h às 19h. As aulas serão na Plataforma Zoom.

Custo: R$ 50,00, à venda na loja da plataforma Intersecções - https://bit.ly/FleaLab1Modulo.

Facilitador: Bob Luiz Botelho é co-fundador e coordenador executivo do Evangélicxs Pela Diversidade, reverendo da Iglesia Antigua de las Américas (IADLA - Brasil), missionário há mais de 10 anos, LGBTI+, tem formação em missiologia e teologia pastoral, cursa Geografia na UFPR. Através da Coalizão Religiões, Crenças e Espiritualidades em Diálogo com a Sociedade Civil, tem participado de fóruns internacionais, incluindo a OEA, e integrou a equipe da Global Interfaith Network. É produtor cultural e já trabalhou com companhias profissionais de dança e na produção de grandes festivais.

Para maiores informações sobre o FLEA.lab e para acessar o conteúdo programático e proposta pedagógica do curso, acesse https://bit.ly/FleaLabInfo

terça-feira, 16 de março de 2021

Participe do evento online “Intolerância Religiosa no Brasil: Direitos Humanos - Novos Fundamentalismos - Exclusão”

Será realizado na próxima quarta-feira, 17/03, às 10h de Brasília, o evento online “Intolerância Religiosa no Brasil: Direitos Humanos - Novos Fundamentalismos - Exclusão”. A atividade, que ocorrerá em paralelo à 46ª sessão ordinária de Direitos Humanos das Nações Unidas, tem por objetivo analisar e debater os impactos das agendas fundamentalistas na vida das mulheres, povos originários e comunidades tradicionais.

Organizações religiosas e de direitos humanos, entre elas o CONIC, são proponentes desta ação, que também tem como objetivo é ouvir experts da ONU sobre liberdade religiosa, os standards internacionais aplicáveis em matéria de intolerância religiosa e os caminhos práticos para superá-los. 
 
Os organizadores esperam identificar as interconexões entre os diferentes fundamentalismos para a articulação e formação de alianças estratégicas entre diferentes grupos e movimentos. Compreende-se que os fundamentalismos resultam de estratégias que ameaçam e buscam controlar as democracias, afetando diretamente a defesa e ampliação dos direitos humanos, econômicos, sociais, ambientais e culturais. Os fundamentalismos desafiam as respostas desenvolvidas por organizações de direitos humanos e reduzem o espaço de participação da sociedade civil organizada.
 
A mesa será composta por:
  • Ahmed Shaheed, relator Especial das Nações Unidas sobre Liberdade de Religião ou Crença; (a confirmar)
  • Adelaide Lopes, Ñandesy Kaiowá (Pajé) membra da Aty Guasu Kaiowá e Guarani no Mato Grosso do Sul e do movimento de mulheres indígenas; 
  • Wania Sant'Anna, historiadora, membro da Coalizão Negra por Direitos, com pesquisas no campo das relações de gênero e relações étnico/raciais. Ex-Secretária de Direitos Humanos do Estado do Rio de Janeiro e atualmente vice-presidente do Conselho do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (IBASE);  
  • Magali do Nascimento Cunha, doutora em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo, coordenadora do Grupo de Pesquisa Comunicação e Religião da INTERCOM (Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação). Coordenou a pesquisa Fundamentalismos, crise da democracia e ameaça aos direitos humanos na América do Sul;
  • Romi Márcia Bencke, pastora, bacharel em Teologia pelas Faculdades EST, mestre em Ciência da Religião pela Universidade Federal de Juiz de Fora, secretária-geral do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (CONIC). 
 
A mediação será realizada por Paulo Lugon, do Conselho Indigenista Missionário (Cimi). O evento será transmitido pelas redes sociais das organizações proponentes, o que possibilitará aos internautas acompanhar o debate, comentar e enviar perguntas aos palestrantes. A Pa. Dra. Elaine Neuenfeldt, do Programa Global de Justiça de Gênero da Aliança ACT, e a Irmã Lúcia Gianesini, vice-presidente do Cimi, farão a abertura do evento.
 
Organizações proponentes:
 
  • Conselho Indigenista Missionário - Cimi
  • Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil - CONIC (no dia do evento, clique aqui https://www.facebook.com/conselhonacionaldeigrejas para assistir)
  • Articulação para o Monitoramento dos Direitos Humanos no Brasil - AMDH
  • Movimento Nacional de Direitos Humanos - MNDH
  • Coalizão Negra por Direitos
  • Fórum Ecumênico ACT Brasil - FE ACT Brasil
  • ACT Alliance
  • Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas - Ibase
  • Fundação Luterana de Diaconia - FLD
  • Sinfrajupe - Serviço Inter-Franciscano de Justiça, Paz e Ecologia
  • Coordenadoria Ecumênica de Serviço - CESE
  • Processo de Articulação e Diálogo Internacional - PAD
  • KOINONIA Presença Ecumênica e Serviço
  • Red Latinoamericana Iglesias y Minería - IyM
  • DIACONIA
  • Misereor
 
Serviço:
 
O quê: Evento para debater intolerância religiosa, direitos humanos, novos fundamentalismos e exclusão.
Quando:  Quarta-feira, 17 de março, às 10h (horário de Brasília). Durante a 46º sessão do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas.
Quem: Organizações proponentes do evento.
Por onde acompanhar: Pelas redes sociais das organizações proponentes, como aqui https://www.facebook.com/conselhonacionaldeigrejas

Fonte: CONIC

 

GMSECA convida para Seminário "Mulheres em Movimento"



 
Neste mês das mulheres, o Grupo de Pesquisa Movimentos Sociais, Educação e Cidadania na Amazônia - GMSECA/UEPA - promove o seminário Mulheres em movimento: reflexões e ações das mulheres nos sindicatos, partidos políticos e movimentos sociais.
O evento será todo online pela plataforma Google MEET, de 22 a 24 de março de 2021, sempre das 18h30 as 21h30.
A inscrição para participar é feita no link https://forms.gle/AaRuuTVLWb62y16b9

sábado, 27 de fevereiro de 2021

Ramagem ganha nova marca

O Instituto Ramagem nasceu, em 21 de janeiro de 2013 (Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa), da iniciativa de pessoas que se dedicam em promover a diversidade religiosa e combater todas as formas de violência com motivação de fé.
Inspirada nesta história e pela grandiosidade das Samaumeiras, a artista plástica Melissa Coppe elaborou a nossa nova logo: um ramo circular aberto com folhas coloridas.
E é isso que o Ramagem busca ser em sua trajetória. 
Atuando sempre no princípio do círculo, quando tudo se iguala, ninguém em frente ou atrás; na abertura ao diálogo, ao acolhimento; na beleza da diversidade, do multiculturalismo; e tudo isso fincado nas raízes dos direitos humanos.

Nossa gratidão à Melissa Coppe.
E para quem quiser conhecer mais dos seus trabalhos, acesse seu blog: https://www.melissacoppe.com/ 

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2021

Religiões pela Paz Brasil lança declaração pela vacinação

Religiões pela Paz Brasil une lideranças de múltiplas crenças para assinar documento que conclama governantes e população a se comprometerem com a imunização contra a Covid-19. 

O documento que ressalta a importância de seguir as orientações dos especialistas, profissionais da saúde e cientistas, fortalecer a saúde pública e combater a rede de desinformação em torno da doença. A declaração pode ser conferida na íntegra no site e redes sociais da organização.

Assinada por líderes de diversas tradições religiosas, a declaração também salienta que cada brasileiro tem o dever de conter a disseminação do coronavírus, tanto através das medidas de autocuidado quanto por meio da adesão à campanha nacional de vacinação.

Segundo a Pra. Romi Bencke, a vacinação é um cuidado coletivo, um ato de fé, generosidade e compaixão para consigo e a sociedade. “A vacinação é uma atitude de amor a si mesmo e à pessoa próxima. Quando tomamos a vacina, demonstramos em gesto concreto que estamos comprometidos e comprometidas com o bem comum”, explica a Secretária Geral do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs (CONIC).

Além disso, a declaração honra a incansável luta dos profissionais da saúde ao redor do mundo para erradicar a doença, e chama à responsabilidade governantes pela má gestão do sistema público de saúde neste momento pandêmico e parte das lideranças religiosas, que tem contribuído para reforçar um discurso anticientífico.

De acordo com o Sheikh Mohamad Al-Bukai, Diretor de Assuntos Islâmicos da União Nacional das Entidades Islâmicas (UNI), demonstrar à população brasileira o quanto a vacinação é relevante, enquanto liderança religiosa, diz respeito ao compromisso com os seres vivos presentes no planeta. “Todas as religiões estão comprometidas com tudo relacionado à vida porque, segundo as religiões, a vida é sagrada, seja ela a vida de uma pessoa, animal ou natureza”, analisa ele.

Confira a declaração na íntegra clicando aqui.


Com informações do site: Religiões Pela Paz

segunda-feira, 25 de janeiro de 2021

URGENTE: PELA LIBERDADE IMEDIATA DO ADVOGADO JOSÉ VARGAS JUNIOR

O defensor de direitos humanos e advogado dos trabalhadores sem terra que sobreviveram ao Massacre de Pau D’Arco, José Vargas Sobrinho Junior, está preso desde o dia primeiro de janeiro de 2021 em Redenção, no Pará. Ele é acusado pelo Ministério Público e pela Polícia Civil de envolvimento na desaparição do ex-candidato a vereador Cícero José Rodrigues de Souza.
 
No último dia 4, a justiça negou o pedido de liminar em habeas corpus impetrado pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Vargas permanece em prisão preventiva. As organizações que assinam esta carta pedem a soltura imediata do advogado. 
 
As alegadas provas produzidas pela polícia contra Vargas – áudios de Whatsapp em que comentava o sumiço de Cícero – são absurdamente frágeis. No habeas corpus, a OAB argumenta que sua prisão havia sido baseada “em premissas hipotéticas, sem comprovação nos autos” que não poderiam “ancorar medida extrema, especialmente sob a imputação de crime hediondo”. No pedido ao Tribunal de Justiça, defende que a prisão está apoiada numa “fantasiosa tese levantada pela autoridade policial”.

Vargas tem longa trajetória em defesa dos direitos humanos no sul do Pará, a região onde mais foram assassinadas lideranças em conflitos no campo. No Massacre de Pau D’Arco, ocorrido em 2017, foram executados por policiais civis e militares dez sem-terra – um crime cujos algozes, até hoje, caminham em liberdade pelas ruas de Redenção. Ameaçado pela sua posição intransigente na busca por justiça e reparação para os sobreviventes, Vargas foi incluído no Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos. O advogado chegou a ser forçado a deixar a cidade junto de sua família, sob intensas ameaças de morte.
 
Além de Pau D’arco, Vargas atua em casos emblemáticos, como na defesa de trabalhadores contra a multinacional JBS, e de indígenas Kayapó contra empresas mineradoras. Reconhecido por sua atuação, recebeu o prêmio João Canuto em 2017, concedido pelo Movimento Humanos Direitos (MHuD), e a medalha Paulo Frota 2018, outorgada pela Assembleia Legislativa do Pará.

Vargas foi preso em casa diante de sua esposa e de suas duas filhas. Seu computador e seu telefone celular foram apreendidos. A prisão afeta não somente a ele e sua família, mas também a centenas de pessoas dos casos em que ele atua – trabalhadores sem terra, indígenas, camponeses: a gente pobre desta terra, e de quem Vargas sempre foi um aliado.

O grave desaparecimento de Cícero – que, além de ex-candidato a vereador, é presidente da Associação Regional de Pessoas com Epilepsia de Redenção – deve ser investigado e elucidado. Desde o dia 20 de outubro de 2020, não há informações sobre o seu paradeiro. Também demandamos, assim, que as investigações prossigam e que Cícero seja encontrado; e prestamos solidariedade à sua família, que está sofrendo.
 
E exigimos o imediato relaxamento da prisão de Vargas. Ele possui o direito constitucional de responder em liberdade pelas acusações que lhe forem feitas, como prevê a legislação brasileira para pessoas com vínculo empregatício comprovado, residência fixa e sem antecedentes criminais. O que se pede, então, é que a Lei seja cumprida e os ritos processuais sejam seguidos. Arbitrária, a prisão de Vargas coloca em xeque a credibilidade do Estado de Direito no Brasil. Neste momento em que as instituições brasileiras estão sob ameaça, mais do que nunca, perguntamos: serão letras mortas, as nossas leis?

Segunda-feira, 11 de janeiro de 2021

ASSINAM:
Acampamento Jane Júlia – Pau D’Arco
Articulação dos Povos Indígenas no Brasil (APIB)
Articulação Comboniana de Direitos Humanos
Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais no Estado da Bahia (AATR)
Brigadas Populares
Campanha Nacional em Defesa do Cerrado
Centro de Apoio aos Direitos Humanos Valdício Barbosa dos Santos
Centro de Defesa dos Direitos Humanos de Petrópolis
Centro de Defesa dos Direitos Humanos Dom Thomas Balduino
Coletivo Margarida Alves de Assessoria Popular
Conselho Indigenista Missionário (Cimi)
Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ)
Front Line Defenders
Iniciativa Direito à Memória e Justiça Racial (IDMJR)
Justiça Global
Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB)
Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH)
Movimento Pela Soberania Popular na Mineração (MAM)
Movimento Terra Livre
Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST)
ONG Criola
Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em Redenção/PA
Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares (RENAP)
Sindicato dos Trabalhadores na Indústria do Petróleo (Sindipetro) PA/AM/MA/AP
Sociedade Maranhense de Direitos Humanos
Terra de Direitos
Tuxa Ta Pame – Conselho de Gestão Ka’apor
VIVAT International – Brasil
 
 
Mais:
 
Apoie:
 

quinta-feira, 21 de janeiro de 2021

21 de janeiro e a necessidade de se mobilizar contra intolerância religiosa

Arte: F. Palmares

Quando, no dia 27 de dezembro de 2007, o presidente Lula sancionou a Lei 11.635, que instituiu o Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa, aspirava-se que, enfim, a sociedade brasileira reconheceria e combateria um dos males históricos enraizados desde a colonização portuguesa destas terras no século XVI: a imposição da fé cristã e, por consequência, a perseguição de outras perspectivas de crença e culto.

As primeiras vítimas desta violência foram os povos nativos que aqui estavam primeiro com suas tradições e uma riquíssima diversidade. Posteriormente, os povos africanos que foram escravizados e sequestrados pra cá. Fogueiras foram acesas e corpos queimados em nome de um "Deus acima de todos". Em 2015, o Papa Francisco, ao visitar a Bolívia, pediu "perdão pelas ofensas da própria Igreja contra os povos originários, e também pelos injustificáveis crimes cometidos em nome de Deus durante a chamada conquista da América”.

Somente no final do século XIX, portanto, com o advento da República e intensos debates sobre a laicidade do Estado, o catolicismo deixa de ser religião oficial. A primeira Constituição da República, de 24 de fevereiro de 1891, no Parágrafo 3º do Artigo 72, garante que "Todos os indivíduos e confissões religiosas podem exercer pública e livremente o seu culto, associando-se para esse fim e adquirindo bens, observadas as disposições do direito comum".

Nesta conjuntura de abertura religiosa, o protestantismo, outra vertente do cristianismo, estabelece suas missões com maior envergadura, destacando-se o segmento que veio derrotado da Guerra de Secessão nos EUA, altamente racista e escravocrata. Estas missões, em suma, são as instituições modeladoras da teologia fundamentalista e das práticas autoritárias que vão inspirar a organização da maioria das igrejas que hoje chamamos de "evangélicas" e que crescem em progressão geométrica. Segundo o demógrafo José Eustáquio Alves, a população que se declara evangélica no Brasil será maioria já em 2032.

Outras religiões, no Brasil, ficaram na margem da história, ora perseguidas, ora silenciadas. Mesmo com a laicidade do Estado, a cultura religiosa nacional garante ao cristianismo, seja católico ou seja evangélico, privilégios e status que constrangem cotidianamente pessoas de outros credos ou que são ateias. O seu livro sagrado é referendado como O Livro. Sua moralidade é instituída na influência de leis civis e é gabarito comportamental para toda sociedade. Suas organizações possuem direitos, abonos e isenções como nenhuma outra organização de nenhum outro ramo. Privilégios estes que tendem aumentar, visto o número de parlamentares que formam a Bancada Evangélica no Congresso Nacional.  As demais religiões que se ajustem, já que são minoria e não possuem articulação com grande capilaridade para mobilização.

Inclusive, é esta lógica de intimidação religiosa que funciona quando o atual presidente da República, em discurso oficial na Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), no dia 22 de setembro de 2020, fala que o Brasil é "cristão" e "conservador". O próprio slogan governamental fala em "Deus acima de todos". Entretanto, para muitos que se escandalizam com as posturas violentas e bizarras deste governo, contando até com pequenos movimentos de dentro do próprio cristianismo, fica a pergunta: Que Deus é esse de que se está falando?

É o deus que inspirou as fogueiras da Santa Inquisição. É o deus que se satisfez da escravidão. É o deus seguido por traficantes que destroem terreiros e expulsam pais e mães de santos das comunidades. É o deus dos que desejam que quem não o siga vá para o inferno. É o deus de quem agride quem queira viver sua homoafetividade. É o deus do futuro ministro do STF que será "terrivelmente evangélico", palavras do próprio presidente da República. É o deus de pessoas que chamam de assassina uma menina de 10 anos, vítima de estupro, que pede para interromper sua gravidez. É o deus da goiabeira da ministra. É o deus de um governo que, além de generais incompetentes, tem vários representantes desta religiosidade sinistra em elevados cargos.

O considerável retrocesso civilizatório no qual fomos tragados recentemente torna mais urgente e imprescindível celebrar o dia 21 de janeiro: Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa. Pois, o discurso religioso violento, que poderia ser considerado um resíduo cultural do processo histórico da formação do Brasil, hoje, está se institucionalizando com o bolsonarismo. A imposição do fundamentalismo religioso está contaminando políticas públicas, determinando a escolha de agentes públicos e relegando toda a diversidade religiosa ao isolamento.

21 de janeiro de 2000, é a data de falecimento da Iyalorixá baiana Gildásia dos Santos e Santos, conhecida como Mãe Gilda, fundadora do Ilê Axé Abassá de Ogum, Terreiro de Candomblé localizado nas imediações da Lagoa do Abaeté, bairro de Itapuã em Salvador, em 1988. Ela teve sua saúde afetada e morreu de infarto devido à perseguição e calúnia do Jornal Folha Universal, da Igreja Universal do Reino de Deus. Que seu exemplo de bondade e luta por justiça inspire nossa resistência contra a intolerância religiosa, por políticas de inclusão e respeito à diversidade.


Por Tony Vilhena (Cientista Político)